*Reportagem indicada pela aluna: Ruthe Timóteo Silva - 2º ano G- EEMZA
Estudo, feito pela Escola Nacional de Saúde Pública em parceria com o
Instituto Nacional de Câncer, acompanhou 650 mães de todas as regiões
do País, exceto o Norte; pesquisadores avaliaram substâncias existentes
em 14 marcas de tintura e alisadores
Fernanda Bassette - O Estado de S.Paulo
O uso de tinturas ou alisadores de cabelo durante os
três primeiros meses de gravidez aumenta em quase duas vezes o risco de o
bebê desenvolver leucemia nos primeiros dois anos de vida. Embora seja
considerada uma doença rara, a leucemia atinge cerca de 5% das crianças
nessa idade.
A conclusão é do primeiro estudo epidemiológico brasileiro que
investigou o tema. O trabalho foi realizado pela Escola Nacional de
Saúde Pública (ENSP) em parceria com o Instituto Nacional de Câncer
(Inca) por mais de dez anos. Ao menos por enquanto, os dados sugerem que
as mulheres não devem pintar os cabelos durante a gravidez.
O trabalho foi realizado em 15 centros de todas as regiões do País,
exceto a Norte. Foram analisadas 650 mães: 231 com filhos diagnosticados
com leucemia antes de 2 anos de idade e 419 mães controle sem filhos
com câncer.
Segundo o biólogo da ENSP Arnaldo Couto, autor do estudo, das 231
mulheres cujos filhos tiveram leucemia, 35 (ou 15,2%) usaram produtos
químicos no cabelo no primeiro trimestre da gravidez. Entre as 419 mães
controle, 41 (ou 9,8%) utilizaram tinturas no mesmo período.
"O estudo mostrou que a doença não se manifestou ao acaso. Há uma
associação significativa entre a exposição a tinturas e alisantes com o
desenvolvimento de leucemia", diz Couto.
Maria do Socorro Pombo-de-Oliveira, chefe do Programa de Hematologia e
Oncologia Pediátrica do Inca, que coordena o estudo, confirma a
importância do achado e afirma ter ficado surpresa com os resultados.
"É a primeira vez que um trabalho olha para essa direção. Mas, como
se trata de uma doença rara, o número de casos precisa ser confirmado em
análises experimentais posteriores", diz ela.
O estudo. A partir do momento em que uma criança com
menos de 2 anos era diagnosticada com leucemia em um dos centros
parceiros, uma amostra de sangue seguia para o Inca para confirmação
diagnóstica.
Além de confirmar o tipo de leucemia - mieloide aguda (LMA) ou
linfoide aguda (LLA) -, os pesquisadores realizavam a entrevista
materna. A LLA é a mais comum das leucemias infantis - cerca de 75% dos
casos (mais informações nesta pág.).
Depois, uma equipe entrevistava cada uma dessas mães. O questionário
incluía perguntas sobre hábitos de vida: alimentação, tabagismo, uso de
álcool e medicamentos, exposição a agrotóxicos e tinturas.
Para cada mãe com filho com leucemia, os pesquisadores entrevistavam
duas mães controle - com um filho da mesma idade e sem a doença maligna.
As perguntas eram direcionadas para os três meses antes de a mulher
engravidar, os três trimestres da gestação e os três primeiros meses
após o parto. "A ideia era identificar fatores ambientais que poderiam
ter influência no desenvolvimento das leucemias", explica Couto.
Compostos químicos. Os pesquisadores analisaram os
compostos existentes em 14 marcas de tinturas e alisadores. Foram
identificados 150 componentes - 32 deles potencialmente prejudiciais à
saúde do bebê.
Com os dados em mãos, Couto calculou a estimativa de risco de a
criança desenvolver leucemia por a mãe ter feito uso desses produtos. De
acordo com o pesquisador, esse risco é 1,8 vez maior em mães expostas
aos cosméticos do que entre aquelas que não haviam utilizado os produtos
durante a gestação.
"É justamente no primeiro trimestre que o bebê está em formação.
Nessa fase existe uma divisão celular intensa e constante. Uma das
hipóteses é a de que as substâncias químicas alteram o DNA e modificam a
informação genética da criança", diz Couto.
Segundo Maria do Socorro, o próximo passo é descobrir qual mecanismo
levou a esses casos. Os compostos da família dos fenóis, que foram os
mais associados ao aumento do risco, já estão sendo estudados pela
equipe.